quarta-feira, 6 de junho de 2012
Cultura de Massa e Cultura Popular
Como conseqüência das tecnologias de comunicação surgidas no século XX, e das circunstâncias configuradas na mesma época, a cultura de massa desenvolveu-se a ponto de ofuscar os outros tipos de cultura anteriores e alternativos a ela. Antes de haver cinema, rádio e TV, falava-se em cultura popular, em oposição à cultura erudita das classes aristocráticas; em cultura nacional, componente da identidade de um povo; em cultura, conjunto historicamente definido de valores estéticos e morais; e num número tal de culturas que, juntas e interagindo, formavam identidades diferenciadas das populações.
A chegada da cultura de massa, porém, acaba submetendo as demais “culturas” a um projeto comum e homogêneo ou pelo menos pretende essa submissão. Por ser produto de uma indústria de porte internacional (e, mais tarde, global), a cultura elaborada pelos vários veículos então surgentes esteve sempre ligada intrinsecamente ao poder econômico do capital industrial e financeiro. A massificação cultural, para melhor servir esse capital, requereu a repressão às demais formas de cultura de forma que os valores apreciados passassem a ser apenas os compartilhados pela massa.
A cultura popular, produzida fora de contextos institucionalizados ou mercantis, teve de ser um dos objetos dessa repressão imperiosa. Justamente por ser anterior, o popular era também alternativo à cultura de massa, que por sua vez pressupunha originalmente ser hegemônica como condição essencial de existência.
O que a indústria cultural percebeu mais tarde (e Adorno constatou, pessimista), é que ela possuía a capacidade de absorver em si os antagonismos e propostas críticas, em vez de combatê-lo. Desta forma, sim, a cultura de massa alcançaria a hegemonia: elevando ao seu próprio nível de difusão e exaustão qualquer manifestação cultural, e assim tornando-a efemêra e desvalorizada.
A “censura”, que antes era externa ao processo de produção dos bens culturais, passa agora a estar no berço dessa produção. A cultura popular, em vez de ser recriminada por ser “de mau gosto” ou “de baixa qualidade”, é hoje deixada de lado quando usado o argumento mercadológico do “isto não vende mais” depois de ser repetida até exaurir-se de qualquer significado ideológico ou político.
No contexto da indústria cultural da qual a mídia é o maior porta-voz são totalmente distintos e independentes os conceitos de “popular” e “popularizado”, já que o grau de difusão de um bem cultural não depende mais de sua classe de origem para ser aceito por outra. A grande alteração da cultura de massa foi transformar todos em consumidores que, dentro da lógica iluminista, são iguais e livres para consumir os produtos que desejarem. Dessa forma, pode haver o “popular” (i.e., produto de expressão genuína da cultura popular) que não seja popularizado (“que não venda bem”, na indústria cultural) e o “popularizado” que não seja popular (vende bem, mas é de origem elitista).
Questões sobre a Cultura Popular
Quem ou o que determina a cultura popular e qual a sua origem? Ela surge do próprio povo como expressão autônoma de seus interesses e de suas experiências, ou é imposta por aqueles que detêm o poder, como forma de controle social? E ainda: emerge das “classes inferiores” ou vem “de cima” das elites, ou será mais apropriadamente uma questão de interação entre as duas?
Será que o surgimento da cultura na forma de mercadoria prioriza os critérios de rentabilidade e de negociação em detrimento da qualidade, do talento artístico, da integridade e do desafio intelectual? Ou será que a expansão do mercado assegura seu caráter genuinamente popular porque tornou acessíveis mercadorias que o povo realmente deseja? Ou ainda, o que prevalece quando a cultura popular é manufaturada industrialmente e comercializada de acordo com os critérios de mercado?
A cultura popular serve para doutrinar o povo? Para induzi-lo a aceitar e a aderir a idéias e valores que assegurem a continuidade da dominação daqueles que exercem o poder? Ou representa revolta e oposição a ordem social predominante? Será que expressa, de alguma maneira, uma imperceptível, sutil e incipiente resistência ao poder e a subversão das formar dominantes de pensamento e ação?
Essas questões ainda estão muito presentes no estudo da cultura popular, mas assim como outras, receberam uma atenção sistemática e considerável nas discussões sobre cultura de massa que começaram a crescer a partir dos anos 1920. As décadas de 1920 e 1930 foram decisivas para o estudo e a avaliação da cultura popular.
O advento do cinema e do radio, a produção e o consumo de massa, a ascensão do fascismo e o amadurecimento das democracias liberais em certos países ocidentais contribuíram para definir os rumos dos debates sobre cultura de massa. Produtos culturais como filmes de cinema não são produzidos em larga escala como automóveis, já que relativamente poucas cópias são necessárias para se atingir uma grande audiência.
A existência de meios muito eficientes para atingir um grande número de pessoas em sociedades com regimes políticos totalitários foi considerada por muitos uma maneira a mais juntamente com a coerção - de fortalecer tais regimes e de suprimir alternativas democráticas. Os meios de comunicação como o radio e o cinema transmitiam a ideologia oficial do regime fascista porque permitiam o controle centralizado e alcançavam um público enorme.
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